segunda-feira, 22 de julho de 2019

Doce Melancolia

Numa noite em uma praça, bebendo um vinho barato de bar e chorando as mágoas da vida, um estranho me perguntou:
- "Por que você está tão triste? Olha que noite linda, vá se divertir com os seus amigos".
Refleti por alguns minutos e cheguei a conclusão de que não sairia dali: quem disse que eu não estava aproveitando aquela bela noite que fazia?
As pessoas acreditam que a felicidade se resume em viver sorrindo todos os dias, mas somente quando você passa boa parte da sua vida se sentindo triste, é que você entende que não é bem assim. Tudo passou a ser linear e eu percebi que felicidade não é ser, e sim estar. E naquele momento eu não queria estar. Naquele momento eu queria ficar ali, eu e meu vinho sozinhos, sentindo a tristeza e a melancolia que precisavam ser sentidas naquele momento.
Aceitar que a tristeza e a felicidade precisam ser sentidas da mesma forma, é sensato. Mas é somente quando você entende que elas estão contidas uma na outra, que você entende que precisa das duas.
Nunca vi ninguém pedir pra que uma pessoa chorando de alegria parasse de chorar. Mas foram inúmeras as vezes em que vi uma pessoa chorando de tristeza e outras pessoas em volta tentando fazê-la parar.
É como se ficar triste não fosse normal. As pessoas acabam reprimindo essa tristeza por tanto tempo que quando acabam sentindo, sentem tudo de uma vez, por um tempo mais do que o normal.
Imagino se um dia eu visse uma pessoa extremamente feliz, e então apontasse um revólver pra cabeça dela:
- "Você, pare de ficar feliz, AGORA!"
Ela pararia? Bom, provavelmente ficaria com medo do revólver e não sorrisse mais. Mas a partir do momento em que eu fosse embora, ela voltaria a sorrir da mesma forma. Por que então tentar evitar algo natural?
A felicidade responsável pelo meu bem estar, é a mesma responsável pela minha falta de motivação pra me tornar uma pessoa cada vez melhor.
A melancolia responsável pela falta de prazer em viver, é a mesma responsável pela beleza da minha arte.
La Belle Noelle


quinta-feira, 11 de julho de 2019

Pelos livros,
que ainda não li.
Pelos lugares,
que eu ainda não vi.
Pelas memórias,
que eu ainda não escrevi.
Pelas cervejas,
que eu ainda não bebi.
Pelos amores,
que eu ainda não vivi.
RE
SIS
TIR




sexta-feira, 5 de julho de 2019

há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo: fique aí, não deixarei que ninguém o veja.
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas eu despejo uísque sobre ele e inalo
fumaça de cigarro
e as putas e os atendentes dos bares
e das mercearias
nunca saberão que
ele está
lá dentro.
há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo:
fique aí,
quer acabar comigo?
quer foder com o meu trabalho?
quer arruinar as minhas vendas de livros
na Europa?
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou bastante esperto, deixo que ele saia
somente em algumas noites
quando todos estão dormindo.
eu digo: sei que você está aí,
então não fique triste.
depois, o coloco de volta em seu lugar,
mas ele ainda canta um pouquinho
lá dentro, não deixo que morra
completamente
e nós dormimos juntos
assim
como nosso pacto secreto
e isto é bom o suficiente para
fazer um homem
chorar,
mas eu não choro,
e você?


quarta-feira, 3 de julho de 2019


Nada é real. 
Exceto o desejo.
Nada é real.
Exceto
você
enlaçando meus cabelos com os dedos
e me puxando para dentro
para assim
dilacerar minhas verdades
deixar nuas minhas feridas mais profundas
e então
só então
penetrar fortemente a minha alma
e permitir que a correnteza invada cada beco escuro e sombrio que me habita.
Nada é real.
Nada...
Exceto você em mim.